quinta-feira, 11 de agosto de 2011

Aquele olhar...

     Desde criança, todos percebiam que ele era diferente.  Embora ninguém falasse de maneira audível, podi-se ouvir no silêncio dos olhares palavras que lhe feriam a alma. Aquele menino não era "normal".
     Ao olhar-se no espelho, ele também não entendia o porquê de ser assim. Fisicamente, apesar do corpo frágil, era saudável, podia correr, brincar ou fazer bagunça como qualquer criança, mas ele preferia a reclusão. Sentava-se no chão de qualquer lugar onde ninguém pudesse vê-lo e, ora desenhava, ora escrevia... Ou apenas ficava ali, absorto em seus pensamentos. Se alguém se aproximasse, era fácil esboçar um sorriso maroto, tentando convencer a quem quer que fosse que estava ali apenas porque havia aprontado alguma queria se esconder. Mas aquele olhar...
     O tempo passou, o menino cresceu. Passou pela turbulenta fase da adolescência aparentemente imune ou ileso. Concluiu seus estudos, começou a trabalhar, namorou um pouco e até demonstrou algum talento artístico que poderia ser melhor aproveitado, mas não o desenvolveu. Aparentemente, era uma pessoa "normal". Um pouco tímido e careta, mas "normal".
    Ao chegar a casa, todos os dias, religiosamente, sentava-se no chão da cozinha por alguns minutos. Ali, sozinho, repassava mentalmente todos os fatos do dia, tentava imaginar atitudes diferentes, até balbuciava coisas que gostaria de ter dito, mas que não o fez. No fundo, sua maior vontade era dormir e não acordar. Ou acordar e perceber que toda a vida que vivera até aquele momento não havia passado de um "sonho". Procurava encontrar em algum momento da sua vida o ponto onde ele se perdera.
    Após aqueles intermináveis momentos, buscava algo para comer, preparava-se para dormir e descansar um pouco, enfim. Mas, olhando sua imagem no espelho, não podia deixar de notar que o tempo havia passado. Os sulcos em seu rosto indicavam trabalho intenso, afinal, as marcas do tempo se intensificam com o trabalho árduo. Agora, ele usava óculos... É, o tempo deixa marcas... Mas algo não havia mudado: aquele olhar... O que causava aquela sombra? O que havia por trás daquele olhar?

Nenhum comentário:

Postar um comentário